Neste mundo, nada é de graça, especialmente quando estamos falando de saúde. Todos os exames, todas as incisões e cada uma das pílulas que tomamos nos trazem benefícios e riscos.
Em nenhuma área, a coisa pende mais obviamente para a direção errada do que no mundo das doenças infecciosas, a maior história de sucesso do século XX. Nós contamos com os antibióticos desde meados dos anos 1940 – praticamente desde que a bomba atômica foi criada, destaca o Dr. Martin J. Blaser, e o nosso maior erro foi não ter percebido há muito tempo os paralelos entre essas duas histórias.
Os antibióticos controlaram boa parte de nossos velhos inimigos bacterianos: nós queríamos fazê-los desaparecer do planeta, e a dose foi cavalar. Mas, agora, estamos começando a sofrer as consequências. Aparentemente, nem todos os germes são maus – e existem alguns que são muito bons, na verdade. No livro “Missing Microbes” (Os micróbios perdidos, em tradução livre), Blaser, professor de medicina e doenças infecciosas da Universidade de Nova York, apresenta uma série impressionante de razões que nos levam a repensar a destruição promovida nas últimas décadas.
A guerra tem se tornado cada vez mais violenta. O uso imprudente de antibióticos resultou na resistência dos micróbios; médicos especializados em doenças infecciosas operam agora em um estado de quase pânico, uma vez que o tratamento de doenças comuns está exigindo medicamentos mais e mais poderosos. Na semana passada, a Organização Mundial da Saúde alertou que o as pessoas estão voltando a morrer com doenças há décadas já controladas por causa das superbactérias.
As infinitas bactérias benevolentes e trabalhadoras que colonizam nossas peles e o interior do trato gastrointestinal, das quais precisamos para sobreviver, estão sendo exterminadas por até mesmo algumas doses de antibióticos.
Às vezes, nem as populações nem seu habitat voltam a se recuperar plenamente. E, por fim, há acúmulo desanimador de evidências de que a guerra contra as velhas pragas esteja levando simplesmente a guerras ainda piores contra uma série de novas pragas.
Parte dos argumentos de Blaser já é bem conhecida, tais como a história do Clostridium, uma causa cada vez mais comum de diarreia. Essa condição surge quando os antibióticos eliminam a população microbiana normal de nossas entranhas, favorecendo um organismo produtor de toxinas. Às vezes é preciso usar ainda mais antibióticos para restabelecer a função intestinal. Mas às vezes não há tratamento que funcione – nada além de preencher o intestino com fezes repletas de bactérias normais, uma estratégia que é o último recurso, mas que se mostrou bastante eficaz. Sem isso, pessoas saudáveis podem morrer.
ABIGAIL ZUGER THE NEW YORK TIMES